Assisti um filme de terror uma vez, em que ocorre um blecaute num cinema.
Ao retornar a luz, a maioria das pessoas da sessão haviam desaparecido.
Os sobreviventes pouco sabem, a princípio, o porquê daquilo.
Mas percebem que o fenômeno se deu no mundo todo.
Começam a entender que há uma escuridão, que cada vez avança mais e mais.
O sol, a cada dia que passa, surge mais tarde e a noite se prolonga.
Essa escuridão tem por finalidade encurralá-los e, por fim, devorá-los.
Começam a perceber também, que a única coisa que os pode salvar é alguma luz que, por
ventura, consigam manter acessa.
Um a um, são tragados pelas sombras, enquanto correm desesperados atrás de lanternas
e postes de luz, faróis de carros e baterias portáteis.
E dessa maneira que sinto.
Essa luz é tua humanidade.
E essa sombra é a barbárie se aproximando.
Tua vida vale menos que teus pertences e é facilmente tirada por causa de uma discussão.
Essa pequena e preciosa luz, que levamos milênios para criar desde que nos arrastamos
das obscuras cavernas da nossa animalidade, está desaparecendo.
Sendo engolida pela ignorância, pela indiferença e pela esperteza daqueles que já perderam
a sua chama.
E mesmo aqueles que estão no mundo apenas pela festa, quando esta acaba - se não estão
bêbados o suficiente - sentem o perigo a rondá-los, mesmo em seus carros.
Por isso entram assustados para dentro de seus condomínios.
Esperando alí estarem a salvo.
Esquecem eles que castelos já foram postos abaixo.
Enfim: este blog sou eu, correndo com uma lanterna na mão e cuja pilha está enfraquecendo.
Mas, como os personagens do meu filme, continuarei correndo até a escuridão me engolir.
Talvez encontre mais luzes pela frente e consiga espantar as sombras.
Você tem pilhas?
segunda-feira, 30 de maio de 2011
Alberto da Cunha Melo
Parece-me que este poema fala da televisão brasileira, não?
SCRIPT
Fecha A Tempestade de Shakespeare;
depois, rasga O Tufão de Conrad.
Náufragos podem perguntar
- Porque a símile da dor,
a verdadeira já não basta?
- Por que a símile da dor,
a verdadeira já não basta?
Como se não bastasse, criamos,
com as fezes da última peste,
deuses, cada vez mais cruéis.
com as fezes da última peste,
deuses, cada vez mais cruéis.
Mas os castigos e os horrores
viriam de qualquer maneira:
"já estava escrito" - por nós -.
viriam de qualquer maneira:
"já estava escrito" - por nós -.
Também criamos pastorais ,
paraísos e fontes limpas
para os que dormiam mais cedo,
paraísos e fontes limpas
para os que dormiam mais cedo,
e não se encontravam de noite.
Mas só o horror nos fascinava
e, por isso estamos aqui
Mas só o horror nos fascinava
e, por isso, estamos aqui
de novo: - Para que inventar
a Sodoma que já existe
mais populosa, aos nossos pés?
a Sodoma que já existe
mais populosa, aos nossos pés?
Um dia temos de escolher
entre a dor que já padecemos
e a que tentamos inventar.
entre a dor que já padecemos
e a que tentamos inventar.
SCRIPT
Fecha A Tempestade de Shakespeare;
depois, rasga O Tufão de Conrad.
Náufragos podem perguntar
- Porque a símile da dor,
a verdadeira já não basta?
- Por que a símile da dor,
a verdadeira já não basta?
Como se não bastasse, criamos,
com as fezes da última peste,
deuses, cada vez mais cruéis.
com as fezes da última peste,
deuses, cada vez mais cruéis.
Mas os castigos e os horrores
viriam de qualquer maneira:
"já estava escrito" - por nós -.
viriam de qualquer maneira:
"já estava escrito" - por nós -.
Também criamos pastorais ,
paraísos e fontes limpas
para os que dormiam mais cedo,
paraísos e fontes limpas
para os que dormiam mais cedo,
e não se encontravam de noite.
Mas só o horror nos fascinava
e, por isso estamos aqui
Mas só o horror nos fascinava
e, por isso, estamos aqui
de novo: - Para que inventar
a Sodoma que já existe
mais populosa, aos nossos pés?
a Sodoma que já existe
mais populosa, aos nossos pés?
Um dia temos de escolher
entre a dor que já padecemos
e a que tentamos inventar.
entre a dor que já padecemos
e a que tentamos inventar.
domingo, 22 de maio de 2011
Jacques Prévert
PÁGINA DE ESCRITA
Dois e dois quatro
quatro e quatro oito
oito e oito dezesseis...
Repitam! diz o mestre
dois e dois quatro
quatro e quatro oito
oito e oito dezesseis.
Mas eis o pássaro lira
que passa no céu
o menino o vê
o menino o ouve
o menino o chama
Salva-me
brinca comigo
pássaro!
Então o pássaro desce
e brinca com o menino
Dois e dois quatro...
Repitam! diz o mestre
e o menino brinca
o pássaro brinca com ele...
Quatro e quatro oito
oito e oito dezesseis
e dezesseis e dezesseis quanto é?
Não é nada dezesseis e dezesseis
e sobretudo não trinta e dois
de qualquer modo
e eles se vão.
E o menino esconde o pássaro
na sua classe
e todos os meninos
ouvem sua canção
e todos os meninos
ouvem a música
e oito e oito por sua vez se vão
e quatro e quatro e dois e dois
por sua vez se retiram
e um e um não fazem nem um nem dois
um a um se vão igualmente.
E o pásssaro lira brinca
e o menino canta
e o professor grita:
Quando terminarão com esta palhaçada!
Mas todos os outros meninos
escutam a música
e os muros da aula
se desmoronam tranqüilamente.
E as vidraças voltam a ser areia
a tinta volta a ser água
as classes voltam a ser árvores
o giz volta a ser rocha
a pena volta a ser pásssaro.
Dois e dois quatro
quatro e quatro oito
oito e oito dezesseis...
Repitam! diz o mestre
dois e dois quatro
quatro e quatro oito
oito e oito dezesseis.
Mas eis o pássaro lira
que passa no céu
o menino o vê
o menino o ouve
o menino o chama
Salva-me
brinca comigo
pássaro!
Então o pássaro desce
e brinca com o menino
Dois e dois quatro...
Repitam! diz o mestre
e o menino brinca
o pássaro brinca com ele...
Quatro e quatro oito
oito e oito dezesseis
e dezesseis e dezesseis quanto é?
Não é nada dezesseis e dezesseis
e sobretudo não trinta e dois
de qualquer modo
e eles se vão.
E o menino esconde o pássaro
na sua classe
e todos os meninos
ouvem sua canção
e todos os meninos
ouvem a música
e oito e oito por sua vez se vão
e quatro e quatro e dois e dois
por sua vez se retiram
e um e um não fazem nem um nem dois
um a um se vão igualmente.
E o pásssaro lira brinca
e o menino canta
e o professor grita:
Quando terminarão com esta palhaçada!
Mas todos os outros meninos
escutam a música
e os muros da aula
se desmoronam tranqüilamente.
E as vidraças voltam a ser areia
a tinta volta a ser água
as classes voltam a ser árvores
o giz volta a ser rocha
a pena volta a ser pásssaro.
quinta-feira, 19 de maio de 2011
Pôr o pensamento a pensar
"Caídos na imanência dos dias que correm, acomodamo-nos aos lugares fixos, somos
cada vez mais espectadores indiferentes, contempladores insensíveis de um mundo sem
remissão, de onde a política, contra todas as aparências, parece ter desertado. O primado
da economia sobre tudo o resto é uma consequência do niilismo moderno que aprisionou
os homens no labirinto do mercado. O torvelinho da técnica, irmã da economia, tudo arrasta
no seu vórtice, originando novas patologias de posição, desenraizadas, transitórias, etéreas.
A política há muito que deixou de ser um caminho para a paz e a plenitude para se transformar
numa estratégia guerreira de ascensão ao poder. O ambiente enlouqueceu perante a obscena
indiferença do mundo. "Que fazer quando tudo arde?", como pergunta António Lobo Antunes
num romance homônimo. Talvez "pôr o pensamento a pensar", desenhando mapas e
contra-mapas do porvir do mundo.Talvez, sermos heterodoxos."
João Ventura
(O leitor sem Qualidades)
cada vez mais espectadores indiferentes, contempladores insensíveis de um mundo sem
remissão, de onde a política, contra todas as aparências, parece ter desertado. O primado
da economia sobre tudo o resto é uma consequência do niilismo moderno que aprisionou
os homens no labirinto do mercado. O torvelinho da técnica, irmã da economia, tudo arrasta
no seu vórtice, originando novas patologias de posição, desenraizadas, transitórias, etéreas.
A política há muito que deixou de ser um caminho para a paz e a plenitude para se transformar
numa estratégia guerreira de ascensão ao poder. O ambiente enlouqueceu perante a obscena
indiferença do mundo. "Que fazer quando tudo arde?", como pergunta António Lobo Antunes
num romance homônimo. Talvez "pôr o pensamento a pensar", desenhando mapas e
contra-mapas do porvir do mundo.Talvez, sermos heterodoxos."
João Ventura
(O leitor sem Qualidades)
Duas Frases
"Ando a cantar o mal-estar profundo dos seres humanos, dos animais e das plantas,
ando à procura de um final feliz. Ando a ver se o fulgor que, por vezes, há nas coisas,
é melhor guia do que as crenças sobre elas, ou dos pensamentos que, a propósito delas,
nos ocorrem".
Maria Gabriela Llansol
(Lisboaleipzig 2)
"A serenidade e a justeza das coisas evidentes: pão, água, o convívio com as plantas e
os animais, alguma luz mesmo de noite, alguma noite no corpo da própria luz. E o amor
como partilha do mais difícil".
Eduardo Prado Coelho
(Público)
ando à procura de um final feliz. Ando a ver se o fulgor que, por vezes, há nas coisas,
é melhor guia do que as crenças sobre elas, ou dos pensamentos que, a propósito delas,
nos ocorrem".
Maria Gabriela Llansol
(Lisboaleipzig 2)
"A serenidade e a justeza das coisas evidentes: pão, água, o convívio com as plantas e
os animais, alguma luz mesmo de noite, alguma noite no corpo da própria luz. E o amor
como partilha do mais difícil".
Eduardo Prado Coelho
(Público)
quarta-feira, 18 de maio de 2011
Um Poema
Na Morte de Ezequiel Martínez Estrada
Se o universo fosse limitado em suas combinações,
Caberia alguma esperança. Mas não há nenhuma.
Por isso lhe dou esta espécie de adeus,
Lhe assegurando que no rio dos meus acasos,
E nos de muitos como eu,
Há um que foi você.
E é esta a única imortalidade possível:
Que eu já não possa ser como era
Antes de o ter conhecido e querido muito.
Tudo não é mais do que um sopro:
Você, eu, o universo, mas
Já que existiu gente como você,
É provável, bastante provável,
Que tudo isto tenha algum sentido.
Por enquanto já sei: não baixar a cabeça.
Obrigado, e adeus.
Roberto Fernández Retamar
(Só Poema Bom - Paulo Hecher Filho)
segunda-feira, 9 de maio de 2011
O Velho "Buck"
SPLASH
a ilusão é pensar que você está apenas
lendo este poema.
a realidade é que isto é
mais que um
poema.
isto é a faca do mendigo.
isto é uma tulipa.
isto é um soldado marchando
sobre Madri.
isto é você no seu
leito de morte.
isto é Li Po rindo
lá embaixo.
isto não é a porra
de um poema.
isto é um cavalo adormecido.
uma borboleta em
seu cérebro.
isto é o circo
do diabo.
você não está lendo isto
numa página.
a página é que está lendo
você.
sacou?
é como uma cobra.
é uma águia faminta
rondando o quarto.
isto não é um poema.
poemas são um tédio,
eles te fazem dormir.
essas palavras te arrastam
para uma nova
loucura.
você foi abençoado,
você foi atirado
num
lugar que cega
de tanta luz.
o elefante sonha
com você
agora.
a curva do espaço
se curva e ri.
você já pode morrer agora.
você já pode morrer do jeito
que as pessoas deveriam
morrer:
esplêndidas,
vitoriosas,
ouvindo música,
rugindo,
rugindo,
rugindo.
Charles Bukowski
(Revista Coyote)
a ilusão é pensar que você está apenas
lendo este poema.
a realidade é que isto é
mais que um
poema.
isto é a faca do mendigo.
isto é uma tulipa.
isto é um soldado marchando
sobre Madri.
isto é você no seu
leito de morte.
isto é Li Po rindo
lá embaixo.
isto não é a porra
de um poema.
isto é um cavalo adormecido.
uma borboleta em
seu cérebro.
isto é o circo
do diabo.
você não está lendo isto
numa página.
a página é que está lendo
você.
sacou?
é como uma cobra.
é uma águia faminta
rondando o quarto.
isto não é um poema.
poemas são um tédio,
eles te fazem dormir.
essas palavras te arrastam
para uma nova
loucura.
você foi abençoado,
você foi atirado
num
lugar que cega
de tanta luz.
o elefante sonha
com você
agora.
a curva do espaço
se curva e ri.
você já pode morrer agora.
você já pode morrer do jeito
que as pessoas deveriam
morrer:
esplêndidas,
vitoriosas,
ouvindo música,
rugindo,
rugindo,
rugindo.
Charles Bukowski
(Revista Coyote)
Um Conto
Relí ontem o conto "O Pedestre" de Ray Bradbury.
Eis um trecho:
- Negócio, ou profissão?
- Acho que me pode chamar de escritor.
- Sem profissão - disse o carro de polícia, como se falando sozinho. A luz mantinha-o
transfixado como um espécime de museu, agulha espetada no meio do peito.
- Pode-se dizer que sim - afirmou o sr. Mead. Havia anos que não escrevia. Não se
vendiam mais livros e revistas. Tudo continuava como sempre nas casas-tumbas, à noite,
ele pensou. Os túmulos, mal-iluminados pela luz da televisão, onde as pessoas sentavam-se
como os mortos, as luzes cinzentas ou multicoloridas tocando suas faces, mas nunca de
fato tocando a eles.
Eis um trecho:
- Negócio, ou profissão?
- Acho que me pode chamar de escritor.
- Sem profissão - disse o carro de polícia, como se falando sozinho. A luz mantinha-o
transfixado como um espécime de museu, agulha espetada no meio do peito.
- Pode-se dizer que sim - afirmou o sr. Mead. Havia anos que não escrevia. Não se
vendiam mais livros e revistas. Tudo continuava como sempre nas casas-tumbas, à noite,
ele pensou. Os túmulos, mal-iluminados pela luz da televisão, onde as pessoas sentavam-se
como os mortos, as luzes cinzentas ou multicoloridas tocando suas faces, mas nunca de
fato tocando a eles.
domingo, 8 de maio de 2011
Campos de Carvalho
"Se não posso mudar o mundo, tampouco permitirei que o mundo me mude a mim,
arrancando-me esse câncer de mistérios e heresias que é toda a minha riqueza e que
faz com que minha voz não seja apenas o grunhido de um porco, nem meu olhar
apenas o olhar de um peixe dentro do aquário."
Da revista Coyote
arrancando-me esse câncer de mistérios e heresias que é toda a minha riqueza e que
faz com que minha voz não seja apenas o grunhido de um porco, nem meu olhar
apenas o olhar de um peixe dentro do aquário."
Da revista Coyote
sábado, 7 de maio de 2011
Arte Moderna e Pós-moderna
"Desde o instante em que a arte deixa de ser o alimento para as melhores mentes,
o artista pode usar todos os truques do charlatão intelectual. Hoje em dia, a maioria
das pessoas não espera mais receber consolo ou exaltação da arte.
Os "refinados", os ricos, os ociosos profissionais, os destiladores de quintessências
buscam o que é novo, estranho, extravagante, escandaloso na arte. Eu mesmo, desde
o cubismo e além dele, contentei esses mestres e esses críticos com todas as bizarrices
mutáveis que me passaram pela cabeça.
E quanto menos eles me compreendiam, mais eles me admiravam. À força de me
divertir com todas essas brincadeiras, com todos esses quebra-cabeças, enigmas,
arabescos, eu fiquei célebre, e muito rapidamente. E a celebridade para um pintor
significa vendas, lucros , fortuna, riqueza. E hoje, como o senhor sabe, eu sou famoso,
eu sou rico.
Mas, quando estou sozinho comigo mesmo, não tenho a coragem de me considerar
um artista no sentido antigo e grande da palavra. Giotto, Tiziano, Rembrandt e Goya
foram grandes pintores: eu sou apenas um divertidor do público - um charlatão.
Compreendi o tempo em que vivi e explorei a imbecilidade, a vaidade, a avidez de
meus contemporâneos. É uma amarga confissão a minha, na verdade mais dolorosa
do que parece. Mas ela tem o mérito de ser sincera."
Giovanni Papini
( Libro Nero, 1951)
o artista pode usar todos os truques do charlatão intelectual. Hoje em dia, a maioria
das pessoas não espera mais receber consolo ou exaltação da arte.
Os "refinados", os ricos, os ociosos profissionais, os destiladores de quintessências
buscam o que é novo, estranho, extravagante, escandaloso na arte. Eu mesmo, desde
o cubismo e além dele, contentei esses mestres e esses críticos com todas as bizarrices
mutáveis que me passaram pela cabeça.
E quanto menos eles me compreendiam, mais eles me admiravam. À força de me
divertir com todas essas brincadeiras, com todos esses quebra-cabeças, enigmas,
arabescos, eu fiquei célebre, e muito rapidamente. E a celebridade para um pintor
significa vendas, lucros , fortuna, riqueza. E hoje, como o senhor sabe, eu sou famoso,
eu sou rico.
Mas, quando estou sozinho comigo mesmo, não tenho a coragem de me considerar
um artista no sentido antigo e grande da palavra. Giotto, Tiziano, Rembrandt e Goya
foram grandes pintores: eu sou apenas um divertidor do público - um charlatão.
Compreendi o tempo em que vivi e explorei a imbecilidade, a vaidade, a avidez de
meus contemporâneos. É uma amarga confissão a minha, na verdade mais dolorosa
do que parece. Mas ela tem o mérito de ser sincera."
Giovanni Papini
( Libro Nero, 1951)
Para Sempre
Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
àgua pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
- mistério profundo -
de tirá-la um dia?
Fôsse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará para sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.
Carlos Drummond de Andrade
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
àgua pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
- mistério profundo -
de tirá-la um dia?
Fôsse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará para sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.
Carlos Drummond de Andrade
terça-feira, 3 de maio de 2011
Dois Documentários
Há uma citação, não lembro-me de quem, que diz:
"O que é roubar um banco comparado com fundar um banco ?"
E conheço uma piada que diz:
"Os bancos instalaram câmeras de segurança para identificarem os ladrões.
Por que ? Não se conhecem os donos?"
E a Zero Hora publicou um artigo criminoso no caderno de economia desta semana.
Escrito - claro - por um economista da chamada "Escola de Chicago", que prega a
liberdade(desregulamentação) dos bancos e do sistema financeiro.
Liberdade esta que foi responsável pela última crise mundial e acabou com sonhos e
projetos de inúmeros trabalhadores e pais de família no mundo todo.
E que afetou qualquer um que precise trabalhar para viver.
Corroborando o que foi escrito acima, ví dois documentários imperdíveis - para quem
vive no mundo e se importa.
Ao menos consigo mesmo.
Imperdíveis porque explicam para onde vai o dinheiro que não tens para pagar tuas
contas, porque perdes teu emprego e porque teus filhos vão ter que passar por cima de
outros seres humanos para sobreviver.
Creio que este é um assunto que te interessa. Ou não ?
Agora que já passou o casamento real, e antes que a mídia crie outro factóide para
distraí-lo, procure estes filmes:
- "Trabalho Interno" - ainda em cartaz na Casa de Cultura Mário Quintana ou disponível
para download na rede e "A Doutrina do Choque" disponível na rede.
Assista.
É imprescindível.
"O que é roubar um banco comparado com fundar um banco ?"
E conheço uma piada que diz:
"Os bancos instalaram câmeras de segurança para identificarem os ladrões.
Por que ? Não se conhecem os donos?"
E a Zero Hora publicou um artigo criminoso no caderno de economia desta semana.
Escrito - claro - por um economista da chamada "Escola de Chicago", que prega a
liberdade(desregulamentação) dos bancos e do sistema financeiro.
Liberdade esta que foi responsável pela última crise mundial e acabou com sonhos e
projetos de inúmeros trabalhadores e pais de família no mundo todo.
E que afetou qualquer um que precise trabalhar para viver.
Corroborando o que foi escrito acima, ví dois documentários imperdíveis - para quem
vive no mundo e se importa.
Ao menos consigo mesmo.
Imperdíveis porque explicam para onde vai o dinheiro que não tens para pagar tuas
contas, porque perdes teu emprego e porque teus filhos vão ter que passar por cima de
outros seres humanos para sobreviver.
Creio que este é um assunto que te interessa. Ou não ?
Agora que já passou o casamento real, e antes que a mídia crie outro factóide para
distraí-lo, procure estes filmes:
- "Trabalho Interno" - ainda em cartaz na Casa de Cultura Mário Quintana ou disponível
para download na rede e "A Doutrina do Choque" disponível na rede.
Assista.
É imprescindível.
domingo, 1 de maio de 2011
Do Livro "A Resistência"
Porque, à medida que nos relacionamos de forma mais abstrata, vamos nos afastando
do coração das coisas, e uma indiferença metafísica se apossa de nós, enquanto entidades
sem sangue nem nome tomam o poder. Tragicamente, o homem está perdendo o diálogo
com os demais e o reconhecimento do mundo que o rodeia, quando é nele que se dá o
encontro, a possibilidade do amor, os gestos supremos da vida.
As palavras à mesa, inclusive as discussões ou brigas, parecem substituídas pela visão
hipnótica. A televisão tantaliza, como que nos enfeitiça. Esse efeito entre mágico e maléfico
resulta, penso, do excesso de luz que nos toma com sua intensidade. Inevitável lembrar que
ela produz o mesmo efeito nos insetos,e até nos grandes animais.
Então não apenas é difícil afastar-se dela, como também perdemos a capacidade de olhar
e ver o cotidiano. Uma rua com árvores enormes, os olhos cândidos no rosto de uma mulher
velha, as nuvens de um entardecer. A floração da acácia em pleno inverno não chama a atenção
de quem não chega sequer a apreciar os jacarandás de Buenos Aires.
Muitas vezes me espantei ao perceber como enxergamos melhor as paisagens no cinema
do que na realidade.
Ernesto Sabato
do coração das coisas, e uma indiferença metafísica se apossa de nós, enquanto entidades
sem sangue nem nome tomam o poder. Tragicamente, o homem está perdendo o diálogo
com os demais e o reconhecimento do mundo que o rodeia, quando é nele que se dá o
encontro, a possibilidade do amor, os gestos supremos da vida.
As palavras à mesa, inclusive as discussões ou brigas, parecem substituídas pela visão
hipnótica. A televisão tantaliza, como que nos enfeitiça. Esse efeito entre mágico e maléfico
resulta, penso, do excesso de luz que nos toma com sua intensidade. Inevitável lembrar que
ela produz o mesmo efeito nos insetos,e até nos grandes animais.
Então não apenas é difícil afastar-se dela, como também perdemos a capacidade de olhar
e ver o cotidiano. Uma rua com árvores enormes, os olhos cândidos no rosto de uma mulher
velha, as nuvens de um entardecer. A floração da acácia em pleno inverno não chama a atenção
de quem não chega sequer a apreciar os jacarandás de Buenos Aires.
Muitas vezes me espantei ao perceber como enxergamos melhor as paisagens no cinema
do que na realidade.
Ernesto Sabato
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