sábado, 11 de junho de 2011

João Cabral de Melo Neto

     Tem esse poema do João: "Tecendo a Manhã".
     Esta manhã é o futuro. Ele convida a  nos unirmos para que o possamos inventar.
Mas, poeta que é, nos dá a deixa: não o contruiremos com a tecnologia, com o dinheiro.
     Nós o contruiremos com as nossas vozes.
     Vozes essas que precisam, primeiro, serem ouvidas. Por isso um galo "apanha" o grito de outro.
É necessário este movimento lateral  para que haja o entendimento. O futuro não está a tua frente.
Está ao teu lado. Este o gesto essencial para que funcione:
      Ir ao teu semelhante. Ouví-lo.      
      Só assim compreenderemos realmente o que diz  e poderemos passar adiante a mensagem,
formando essa "tenda", que nada mais é do que um lar onde todos se reconheçam.
      Um lar que se vai erguendo pelo contato, pelo convívio, pelo calor do outro.
      Que se forma pelo que é ouvido. Não pelo que é dito.
      Sem paredes, que é para que caibam todos.
      Ele tem razão.
      O mundo não é nossa casa, mas nossa tenda.
      Uma casa tem limites. De capacidade, de deslocamento, de posse.
      Uma casa tem trancas, que nos transformam em "os de dentro" e "os de fora".
      Uma tenda está sempre aberta. É sempre um abrigo. Para quantos.
      Talvez os nômades sejam mais sábios.


             Tecendo a Manhã

     Um galo sozinho não tece uma manhã:
     ele precisará sempre de outros galos.
     De um que apanhe esse grito que ele
     e o lance a outro; de um outro galo
     que apanhe o grito que um galo antes
     e o lance a outro; e de outros galos
     que com muitos outros galos se cruzem
     os fios de sol de seus gritos de galo,
     para que a manhã, desde uma teia tênue,
     se vá tecendo, entre todos os galos.

     E se encorpando em tela, entre todos,
     se erguendo tenda, onde entrem todos,
     se entretendendo para todos, no toldo
     (a manhã) que plana livre de armação.
     A manhã, toldo de um tecido aéreo
     que, tecido, se eleva por si: luz balão.

                                      João Cabral de Melo Neto
         

2 comentários:

  1. bah, paulão, bom saber que um texto escrito por ti pode ser tão bom e contagiante quanto um texto escrito por aqueles que considero bons escritores. já disse uma vez e vou repetir: vou espalhar isto aqui o mais e melhor que puder.

    ResponderExcluir
  2. Com certeza os nômades são sábios! Belo 'escrevendo', divulgarei neste exato momento!

    ResponderExcluir